BIOMATERIAIS

Blog destinado a discussões,reportagens,estudos e análises sobre materiais com aplicações em saúde humana.

segunda-feira, outubro 26, 2015

Bioética e biossegurança: uso de biomateriais na prática odontológica


O expressivo desenvolvimento de biomateriais para utilização em clínica odontológica na última década tem representado um poderoso instrumento terapêutico nas atividades cirúrgicas, especialmente nas correções de defeitos ósseos.3 No entanto, apesar dos comprovados benefícios, sua utilização exige do profissional um cuidado clínico e ético criterioso na análise dos riscos e benefícios que cada biomaterial possa apresentar. Pesquisas antropológicas e arqueológicas mostram que nas comunidades primitivas havia preocupação com a substituição de elementos dentários perdidos. Uma mandíbula de origem Maya, datada dos anos 600 D.C., continha três pequenos fragmentos de coral substituindo os dentes incisivos inferiores. Por meio de exames radiográficos, observou-se a formação de osso compacto em volta destes fragmentos. Dessa forma, esses foram considerados os mais antigos implantes aloplásticos colocados com sucesso em uma pessoa viva no mundo. Isso mostra que, desde muito tempo, coloca-se materiais com desconhecida interação biológica, na intimidade dos tecidos bucais, para substituição de dentes perdidos. Esta prática empírica perdurou durante toda a Idade Média e Contemporânea, quando a odontologia caracterizou-se como atividade essencialmente artesanal, sem embasamento científico. Contudo, o desenvolvimento biotecnológico iniciado nos anos 50 do século passado, acelerado nos últimos anos, trouxe à odontologia avanços significativos, ampliando o campo de trabalho do cirurgião dentista e fortalecendo-a enquanto ciência. Por outro lado, aumentou a responsabilidade do profissional, exigindo constante atualização para absorver os novos conhecimentos gerados.4 No atual mundo globalizado, as descobertas científicas são rapidamente introduzidas e absorvidas pela prática clínica. Na odontologia, novos produtos são lançados diariamente, grande parte corresponde a materiais empregados pelo cirurgião dentista. Esses produtos são usados em contato direto com tecidos vivos, como a dentina, a polpa, osso alveolar e tecido periodontal, algumas vezes permanecendo em sua intimidade por prolongados períodos. Biomaterial é definido, em sentido amplo, como qualquer material farmacologicamente inerte capaz de interagir com um organismo vivo, não induzindo reações adversas no sítio de implantação ou mesmo sistemicamente.9 A aplicação de biomateriais odontológicos sobre os tecidos gengivais, mucosas e tecidos duros constitui um risco terapêutico que pode ser controlado somente por meio do conhecimento das características, concentrações e propriedades dos produtos, por parte do profissional. O uso de biomateriais sem critérios de biossegurança estabelecidos, além de gerar problemas clínicos como o insucesso terapêutico, cria situações de conflito ético. Isso porque o paciente pode ser submetido a uma terapêutica sem o conhecimento dos riscos advindos, tanto por sua parte como do próprio profissional.4 Segundo Schramm* (1998), biossegurança é "o conjunto de ações voltadas para prevenção, minimização ou eliminação de riscos inerentes às atividades de pesquisa, produção, ensino, desenvolvimento tecnológico e prestação de serviços, riscos que podem comprometer a saúde, o meio ambiente ou a qualidade do trabalho desenvolvido". Tanto a bioética quanto a biossegurança se ocupam da probabilidade dos riscos, de degradação da qualidade de vida dos indivíduos e populações e da aceitabilidade de novas práticas. Entretanto, a biossegurança quantifica e pondera os riscos e benefícios, ao passo que a bioética analisa os argumentos racionais que justificam ou não tais riscos.* A teoria bioética do Principialismo proposta por Beauchamp & Childress1 (2001), em Principles of Biomedical Ethics, se transformou na principal fundamentação teórica do novo campo da ética biomédica. Ela aplica um sistema de princípios – autonomia, beneficência, não-maleficência e justiça – para a área clínico-assistencial em situações do cotidiano da relação profissional-paciente. A rapidez dos avanços científicos e tecnológicos passou a exigir uma reflexão ética mais acurada sobre o agir do profissional envolvido com as novas descobertas no campo da biomedicina.6 É nesse contexto que a bioética se apresenta como novo território de estudo e reflexão ético-moral, envolvendo diferentes movimentos e sujeitos, orientados para o agir profissional, no respeito à cidadania e aos direitos humanos, em contextos temporais e espaciais onde pessoas se encontram vulneráveis, tanto no acesso como na busca da saúde. Segundo Muñoz & Fortes** (1998), o paciente tem o direito moral de ser esclarecido sobre a natureza e os objetivos dos procedimentos diagnósticos, preventivos ou terapêuticos. Da mesma maneira, deve ser informado de sua invasibilidade, duração dos tratamentos, benefícios, prováveis desconfortos e possíveis riscos físicos, psíquicos, econômicos e sociais que possa ter. O profissional de saúde deve apresentar possíveis alternativas de tratamento, quando existentes. A pessoa precisa ser informada da eficácia presumida das medidas propostas, sobre as probabilidades de alteração das condições de dor, sofrimento e de suas condições patológicas, ou seja, deve ser esclarecida em tudo que possa fundamentar suas decisões. Segundo Graham & Harel-Raviv6 (1997), o consentimento informado é um instrumento fundamental para a comunicação entre o paciente e o profissional de saúde. Considerando o exposto, o objetivo do presente trabalho foi analisar o uso de biomateriais em odontologia em aspectos relacionados aos critérios de utilização, riscos, origem, comercialização, controle sanitário e participação do paciente na escolha terapêutica.


  • FONTE
  •  
    Google